Num triângulo rectângulo a área do quadrado construído sobre a hipotenusa é igual à soma das áreas dos quadrados construídos sobre os catetos.
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A relação, anterior, entre os lados e de um triângulo rectângulo, normalmente designada por Teorema de Pitágoras, foi correctamente utilizada em problemas com diversos contextos, desde a antiguidade.
Os primeiros problemas que se conhecem onde esta relação é utilizada remontam ao 2.º milénio a.C. e aparecem na civilização Babilónica.
A escada
O seguinte problema foi retirado de um manuscrito alemão de Peter van Halle, escrito em 1568, mas, salvo as unidades de medida em que está formulado, é muito semelhante a muitos dos problemas, envolvendo o teorema de Pitágoras, que encontramos nos nossos manuais escolares.
No Tratado da Prática D'aritmética, do português Gaspar Nicolas, publicado em 1519, aparecem diversos problemas, em que se utiliza o teorema de Pitágoras, envolvendo torres. O seguinte envolve, igualmente, uma escada. No entanto, a escada, ao contrário do que acontece no problema anterior, não está fixa, desliza, o que torna o problema relativamente mais complicado, mas também menos realista.
Uma versão semelhante deste problema aparece pela primeira vez na tábua babilónica BM 85196 (1650 - 1200 a.C.), com o seguinte texto:
Uma trave de comprimento 0,5 GAR está encostada a uma parede. O seu topo está 0,1 Gar abaixo do que deveria estar se estivesse perfeitamente direita
A que distância da parede está a sua parte de baixo? |
É evidente, que tal como no problema enunciado por Gaspar Nicolas, a trave tem o mesmo comprimento que a parede.
Um problema do mesmo tipo aparece noutra tábua babilónica (BM 34568), mais tardia, de cerca do séc. III a.C., mas neste caso o que se pretende saber é a altura da parede e da trave.
Uma cana está encostada a uma parede. Se desce [na parte de cima] 3 GAR a [parte de baixo] desliza 9 GAR. Qual é o comprimento da cana, qual é a altura da parede?
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De, aproximadamente, o mesmo período é o primeiro papiro egípcio, que se conhece, onde aparecem vários problemas envolvendo o teorema de Pitágoras, o papiro do Cairo.
Uma vara de 10 cúbitos tem a sua base afastada 6 cúbitos. Determina a sua nova altura e a distância que o cimo da vara baixou.
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De novo está implícito que a vara e a parede a que esta está encostada têm exactamente o mesmo comprimento.
O problema chegou igualmente à China, onde aparece no livro Nove Capítulos da Arte Matemática, provavelmente do século II a.C.
A altura de uma parede é 1 zhang. Uma vara de comprimento desconhecido está apoiada na parede, de tal forma que o seu topo coincide com o topo da parede. Se a parte debaixo da vara for afastada da parede mais 1 chi, a vara cairá no chão. Qual é a altura da vara?
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Versões semelhantes deste problema aparecem em quase todas as aritméticas medievais e renascentistas, a figura apresentada ao lado, é retirada da aritmética de Philippo Calandri, de 1491. |
O bambu quebrado
Na China, o livro Nove Capítulos da Arte Matemática, provavelmente do século II a.C., contém um capítulo que contendo problemas apenas sobre o teorema de Pitágoras. Neste aparece, ao que se sabe, pela primeira vez a seguinte versão:
Há um bambu com 1 zhang de altura, partiu-se e a parte de cima toca o chão a 3 chih da base do bambu. Qual é a altura da quebra? | |
Nota: 1 zhang = 10 chih | imagem do livro de Yang Hiu de 1261 |
Este problema parece ter passado da China para a Índia, aparecendo em oito trabalhos indianos desde Bhaskara I (629) a Raghumath-raja (1597). A seguinte é a versão que aparece em Bhaskara II (cerca de,1150):
Se um bambu medindo 32 cúbitos e estando em pé, se partisse, num local, por acção do vento, e a sua extremidade encontrasse o chão a 16 cúbitos da base do bambu. Diz, matemático, a quantos cúbitos da raiz é que ele se partiu?
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Ao entrar na Europa esta versão parece ter deixado o bambu, planta tipicamente chinesa, para passar a figurar com uma árvore. A seguinte versão aparece No Tratado da Prática D'aritmética, do português Gaspar Nicolas, publicado em 1519:
A imagem é retirada da aritmética de Philippo Calandri de 1491, onde o problema aparece exactamente igual, inclusive com as mesma distâncias.
A flor de lótus
Num certo lago, repleto de gansos rosados e de grous, podia-se ver, o topo de um rebento de lótus um span* acima da superfície da água. Forçado pelo vento, avançou gradualmente e foi submerso pela água a uma distância de dois cúbitos.
Calcula, depressa, matemático, a profundidade da água. * span = ½ cúbito. |
Dada uma cana no centro de um pequeno lago quadrado de 1 zhang de lado, a qual está 1 chi acima da água. Quando é puxada para a margem, a sua parte de cima fica rente à tona da água.
Diz: qual é a profundidade de água e o comprimento da cana. Nota: chih = 10 cun |
Outros problemas
Os chineses inventaram numerosos problemas onde é aplicado o teorema de Pitágoras, alguns bastante bastante imaginativos, como é o caso do seguinte:
Uma árvore de 2 zhang de altura tem perímetro de 3 chi. Existe uma videira que se enrola sete vezes à volta da árvore e chega ao topo da árvore. Qual é o comprimento da videira?
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A imagem é retirada do manuscrito de Paolo Dagomari, de 1339
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Encontra muitos outros exemplos de origem chinesa no nono capítulo de Nove Capítulos da Arte Matemática. E as versões hindus de alguns destes problemas, ou mesmo problema originais da Índia no capítulo sobre medida do matemático hindu do século XII, Bhaskara II. Como, por exemplo, o seguinte:
Havia uma palmeira de 100 cúbitos de altura e havia um poço a uma distância de 200 cúbitos da árvore. Estavam dois macacos no cimo da árvore. Um deles desceu da árvore e foi até ao poço. O outro pulou para cima e saltou para o poço seguindo a hipotenusa. Se os dois percorreram a mesma distância, descobre o comprimento do pulo macaco.
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É possível que tenha sido este problema de origem hindu que tenha dado origem ao seguinte problema, muito comum na Idade Média.
As duas torres
No Tratado da Prática D'aritmética, do português Gaspar Nicolas, publicado em 1519, aparece o seguinte problema.
É interessante notar que este problema aparece exactamente igual em Phillipo Calandri (1491), isto não significa que o aritmético português tenha copiado o seu trabalho de Calandri. Na verdade, este baseou-se, segundo ele próprio afirma, no trabalho de Luca Paciolli. No final da Idade Média e na Renascença, era muito comum os autores copiarem uns dos outros!
Este problema parece ter aparecido pela primeira vez em Liber Abaci (1202) deLeonardo de Pisa. A sua versão é traduzida da seguinte forma:
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Calandri, 1491
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